segunda-feira, 27 de abril de 2015

O Teatro de Brecht Tira o Espectador Do Comodismo

O "Teatro Épico" e o 
"Efeito de Estranhamento" 



   Bertold Brecht foi poeta lírico, narrador e um grande autor alemão. Aos vinte e um anos escreveu sua primeira obra "Baal"(1918). Na peça Brecht já penetra na natureza crua do homem. A peça influenciada pelo expressionismo da época - já caracteriza tangencialmente o que veio a ser toda a intensa produção do vigoroso autor dos anos seguintes.

(Baal)

    "Baal" é a história da vida de um poeta e cantor bêbedo, rude e mulherengo. Com o seu amigo músico, Ekart, Baal perambula por toda parte bebendo e lutando. Engravidada por ele, Sophie segue-o e acaba por se afogar. Baal seduz ainda a amante de Ekart que acaba por assassinar. Perseguido pela polícia, morrerá sozinho numa floresta. Apesar de ser um retrato anti-heróico, não há dúvida de que muito da imagem romântica do poeta-fora-da-lei se aplica a este Baal cuja linguagem descende diretamente de Rimbaud e Villon.
    Baal aparece como resposta a “O SOLITÁRIO” (1917) de Hanns Johst, onde se relata a história do poeta alemão Grabbe dando-lhe um significado expressionista contra o qual Brecht se quis insurgir. Inspirando-se na vida do poeta francês, escritor medieval de baladas, François Villon, Brecht pretende em Baal mostrar a natureza elementar do indivíduo que se alimenta do prazer e não pensa sequer em pagar as despesas da vida burguesa. Mas ao longo da escrita, Brecht encontra também Verlaine, Rimbaud e Büchner. 

(Baal)

   Com Baal, Brecht revolta-se contra o fatos expressionista, contra os artistas endeusados, contra o tradicional conflito, por ele repudiado, entre a vida e a arte. Brecht procurava o escândalo e encontrou-o. Pouco depois da estréia, o presidente da câmara de Leipzig proibiu a continuação da peça.

(alemão)

    Brecht foi um dos nomes mais importantes do teatro do século XX; é um dos teatrólogos mais encenados no mundo e dos mais respeitados teóricos do teatro. Junto com o seu "efeito de estranhamento" fez o espectador ser obrigado a assumir uma posição crítica de julgar a ação representada.
   Em 1929 iniciou a sua teoria do "Teatro Épico", e quando o nazismo tomou conta da Alemanha se exilou em outros países europeus. Acusado de atividades anti-americanas, foi forçado a voltar para Alemanha, se fixando em Berlim Oriental, onde fundou sua própria companhia, “O Berliner Ensemble”, que produziu suas últimas peças e foi um dos teatros mais ativos da Alemanha , na segunda metade do século XX.


   A sua teoria propunha uma representação épica do teatro, que pretendia opor-se ao "teatro dramático", que - segundo ele:

“conduz o espectador a uma ilusão da realidade, reduzindo-lhe a percepção crítica.”


    O referido "efeito de estranhamento" tinha objetivo de estimular o senso crítico, tornando claro os artifícios da representação cênica e destacando consequentemente o valor revolucionário do texto. 


   Sua obra abarca o teatro, a poesia, o romance, o ensaio a crítica teatral e o aforismo. O autor inovou ao utilizar temas do mundo americano e da nova indústria de produção serial, foi audacioso no ritmo e na secura de sua lírica.
    Grandes obras marcaram a força do teatro brechtiano:
    "A Vida de Galileu" (1937), tem tudo a ver com as grandes descobertas da ciência na virada do milênio e ainda pontua muito bem a situação mito atual de um grande pesquisador obrigado a lançar mão de aulas particulares, abandonando suas pesquisas, porque o governo não lhe proporciona sequer o suficiente para comer.




(alemão)

   "A Boa Alma de SetSuan" (1939), apresenta uma visão da atualíssima corrupção generalizada que reina o sistema.





   "A Santa Joana dos Matadouros" (1929), com seu clima de sarcasmo generalizado, é outra obra que testemunha a atualidade de Brecht. Potente na crítica, a peça mostra a sujeição de absolutamente tudo ao motivo econômico e não poderia ser mais atual, na apresentação fiel das emoções do mercado e das finanças. 




   Analisando com seriedade, a obra brechtiana vê-se de cara que o autor será sempre atual ou, pelo menos - e isso talvez equivalha a sempre - enquanto houver a exploração do homem pelo homem, a injustiça social, a miséria e a violência do poder.
    Sem dúvida a obra-prima brechtiana ficou por conta da "A Ópera dos Três Vinténs" (1928). 


   Começou quando Brecht convidou Kurt Weill escrever a música para o libreto de "A Ópera dos três Vinténs", baseado numa tradução feita pela sua secretária Elisabeth Hauptmann, de "A Ópera dos Mendigos", de John Gay (para saber mais sobre o estilo teatral de John Gay clique aqui) que havia feito um retrato satírico da classe dominante inglesa. 
   Isso aconteceu porque Brecht recebeu a encomenda de criar em cinco meses um espetáculo para abertura do Theater am Schiffbauerdamm (hoje sede do Berliner Emsemble).    A oportunidade dependia de um texto que servisse às possibilidades daquele teatro do século XIX, assim nascia a grande obra brechtiana. Nas palavras do autor "um experimento em teatro épico".
   "A Ópera dos Três Vinténs", em síntese trata de um bando de mendigos que fundam uma empresa capitalista a fim de melhor competir no mercado. A ironia é muita e cheia de severidade crítica que alcança aspectos econômicos atuais. Uma aguda crítica política ao capitalismo como veículo para sua visão vanguardista de teatro aonde foram usadas técnicas dramáticas experimentais, como a "quarta parede" entre assistência e os atores.


   Inspirados no gênero opereta e comédia musical, Brecht e o até então desconhecido Weill, contaram a história de Mackie Messer e seu amor por Polly, a filha do inimigo J.J. Peauchum. Este, mais conhecido por Rei dos Mendigos, vestia a gangue como deficientes ou mendigos e  os mandava pedir esmolas. Mackie, por seu lado, defendia uma linha mais dura, explorando assaltos e prostituição.


   A estréia da peça de Brecht aconteceu 200 anos depois do sucesso de John Gay.
  Tanto Brecht quanto Weill, não imaginavam o sucesso que a "A Ópera dos Três Vinténs" faria no teatro alemão.
   A gênese da obra é bastante complicada, pois envolve uma das mais importantes parcerias do teatro musical do século XX. Brecht "suspeitava politicamente" dos efeitos potencialmente irracionais e sentimentais que a música podia causar, desejando que essa sempre servisse às palavras por ele escritas.
   Compositor e autor compartilhavam do desejo de experimentar a possibilidade de tornar a ópera accessível e "democrática", fugindo do wagnerismo, ainda latente na Alemanha das primeiras décadas do século XX. A ópera, com suas fortes raízes do século XIX era ainda o grande espetáculo da sociedade e a sua reforma a ópera épica pareceu o veículo mais desafiador.

(Brecht e Weill)

(Wagner)

   Neste formato a ópera tornou-se conhecida, com a sua música cada vez mais associada à interpretação no estilo cabaré berlinense, em gravações célebres que diferem do que está escrito na partitura, e consequentemente, com Weill reduzido ao posto de "compositor de Brecht".
    Restabelecer o desafio esta foi a proposta dessa montagem. Se a gênese da obra, em 1928, estava ligada ao desejo de renovar a ópera ou buscar um novo entendimento de seus conceitos, exercermos hoje a mesma liberdade ao rever um clássico.
   Resumindo esta ópera: estamos diante de uma obra desavergonhadamente materialista, de um cinismo e sátira que beiram a comédia, constantemente chamando a atenção do ator e do espectador para a maneira como as circunstâncias materiais determinam, ou ao menos condicionam o comportamento humano, "O dinheiro controla o mundo" proclama a senhora Peachum. Neste julgamento, temos o tema central da ópera: a ética da nossa sociedade, espelhada na ética do crime organizado e da mendicância. A moral é um luxo com a aquela o pobre não pode arcar. "Primeiro, vem a comida, depois a moral" final do Ato II. Eis uma afirmação sobre moralidade que também é uma afirmação de moral.


   O nome da obra foi decidido poucos minutos antes de se abrir a cortina. Apesar disso, o sucesso foi estrondoso, tanto na Alemanha como no exterior – até 1933, quando os nazistas tiraram a peça de cartaz.
   Em pouco tempo, números como a Balada da Boa Vida, que Mackie canta na prisão, ou a Canção da Dependência Sexual, da "senhorita" Peachum, adquiriram caráter popular. Além disso, Brecht conseguiu mexer com o público, levando-o a refletir.
   No final do segundo ato, por exemplo, o elenco discute a condição humana: "Num mundo como este, o homem, para sobreviver, tem de suprimir a sua humanidade e explorar o seu semelhante".




    Brecht criticava as disparidades sociais da sua época:

"Quero fazer um teatro com funções sociais bem definidas. O palco deve refletir a vida real. O público deve ser confrontado com o que se passa lá fora para refletir como administrar melhor sua vida."






Nenhum comentário:

Postar um comentário