sexta-feira, 20 de junho de 2014

O Realismo Teatral do Século XIX

O Século XIX e o Realismo Teatral 
da Grande Europa:

   Como o novo público burguês não tinha muita paciência para grandes problemas trágicos, o casamento, o adultério, o divórcio, e tudo o que era visto pelo prisma do dinheiro, passaram a ser os temas favoritos. A Peça Bem-Feita tem como sua principal característica apresentar problemas não muito profundos com soluções calculadas para deixar o espectador satisfeito. Na maioria das vezes, um público contente por sentir-se mais sensato ou mesmo bom em relação os personagens da trama.


   Os personagens se opõem uns aos outros em conflitos claros, por meio dos quais o caráter de cada um fica bem revelado. O verso, que se tornou mais flexível com o Romantismo, aos poucos, foi desaparecendo, inteiramente substituído pela prosa.
   O público, que pensava mais em entretenimento do que em arte, "sabia" que em casa ninguém fala em verso; ou seja, agora, o público que frequentava o teatro em sua maioria, não levava em conta a diferença entre a vida e a arte, e passou então a exigir a prosa.
   O autor que melhor representava esse tipo de teatro é Eugène Scribe, uma figura interessante porque escreveu não só livretos para óperas como quase quinhentas peças, metade delas comédia de um ato em torno de uma ação tão bem armada que ninguém se importava muito com o fato de os personagens serem apenas tipos, pouco individualizados. 
  O forte dele, forma as peças em três atos. A divisão desses atos, era a seguinte: o primeiro estabelecia o conflito, o segundo o conflito chegava ao auge, e no terceiro tudo era manipulado para uma solução que agradasse ao público. No segundo ato, aparecia o que era chamado de "cena obrigatória", na qual o protagonista e seu antagonista se enfrentavam.   


    Entre suas peças mais famosas estão "O Casamento por Dinheiro" e "O Copo D´água". O domínio técnico da forma dramática por Scribe é de imensa importância em qualquer panorama do teatro, porque foi esse domínio que permitiu e até mesmo provocou o advento do Realismo, o gênero dominante do século XX.
  Scribe nas suas primeiras obras, marca a forma da "peça bem-feita", de brilho superficial, porém mais tarde chegou a escrever algumas peças de conteúdo mais significativo. Dizem, no entanto, que ele lia os jornais para ver o assunto que estava em pauta, e imediatamente escrevia uma peça a respeito.
   As peças do Pré-Realismo são aproveitadas dos romances que retratavam a vida com mais objetividade e menos idealização. Os principais autores dessa nova etapa do teatro foram Alexandre Dumas filho e Émile Augier.
   Tanto Dumas quanto Augier procuravam enfrentar com um pouco de mais seriedade os problemas da época, ainda davam um jeito de oferece uma solução feita para provocar os aplausos do espectador. A peça mais famosa que se enquadra nesse grupo é "A Dama das Camélias", que, como ainda uma outra obra de Dumas, "Le Demi-Monde", buscava mostrar como a moralidade da burguesia estava sendo corrompida pelo dinheiro.


(A bela atriz sueca Greta Garbo & Robert Taylor em A Dama das Camélias - 1937)

(A Dama das Camélias - legenda espanhol)

   Augier, por outro lado, escreve a ótima comédia "Le Gendre de M. Poirier", mostra a tola ambição do burguês rico de ser recebido pela sociedade mais elegante. O nobre falido casar com uma moça burguesa rica uma eram situações frequentes, e dizia-se que, com isso, o nobre "redourava o brasão". Em "Le Gendre Poirier", sem dúvida para agradar seu público burguês, o ator consegue apresentar um final "feliz", fazendo o nobre reconhecer as virtudes da moça, e o casamento dar certo.


(Emile Augier)

  Na Rússia, Nikolai Gogol ''O Inspetor Geral'' satiriza a corrupção e o emperramento burocrático.

(Nikolai Gogol)







   Anton Tchékhov, ''O Jardim das Cerejeiras':




  E Aleksander Ostrovski, ''A Tempestade'' (Гроза) retratam o ambiente provinciano e a passividade dos indivíduos diante da rotina do cotidiano.

(Aleksander Ostrovski)






   Esses autores e os outros do mesmo gênero já estavam escrevendo na segunda metade do século XIX, sem esquecer, até então que se dava à parte a mais espetacular da Revolução Industrial, aonde as obras realmente correspondiam ao clima social que predominava na Europa Ocidental.
   O Realismo exigiu também transformação nos recursos cênicos, desde a invenção da iluminação a gás. O alemão Duque de Saxe-Meiningen introduziu uma série de novidades na encenação. Ele encenava mais os clássicos do que as peças modernas, mas repudiava a artificialidade das velhas montagens. O duque alemão foi considerado o primeiro diretor teatral moderno.

(Duque de Saxe-Meiningen)

   Uma verdade incontestável, porém, é que o Realismo no teatro foi muito influenciado pelo aparecimento do Realismo na literatura, principalmente de Balzac e Zola.


   Émile Zola inaugurou um novo tipo de drama, com sua peça "Thérese Raquin", sem distorcer a realidade, provar uma tese científica. Seu "drama de idéias" voltava-se para o naturalismo. Descrevia a realidade de forma objetiva e exata, quase fotográfica; as personagens eram como objeto de estudo. Afirmava que não havia mais escolas, nem fórmulas, apenas vida, um imenso campo onde cada um podia estudar e criar livremente.

(Émile Zola)




   O Realismo tem objetivo de apresentar o teatro como o mais parecido possível com o mundo real. Cenários realistas em todos os seus detalhes, com o espaço do palco cercado por três paredes (a do fundo, e as duas laterais), sugerindo que os atores, em cena, estariam separados da platéia por uma quarta parece. Os atores têm de representar sem tomar nenhum conhecimento da existência do público, pois a intenção é fazer com que se comportem como na vida real, sem estarem sendo observados.
   O autor tem que escrever de modo que o diálogo esteja sempre fazendo a ação caminhar, ou passando informações indispensáveis. Os teatros dedicados à linguagem realista chegam mais para o final do século XIX.
   O norueguês Henrik Ibsen, teve uma longa carreira, e ao longo dela passou por vários gêneros diferentes. As peças que lhe deram fama, com exceção da panorâmica e filosófica "Peer Gynt", são as peças realistas, frequentemente montadas ainda hoje. Ibsen era pessoalmente empenhado com toda espécie de problema social.

 (Henrik Ibsen)




(Aquarela de Theodor Kittelsen de um Troll - personagem do folcrore norueguês)



   Sua primeira peça realista foi "A Casa de Boneca", na qual ele denuncia o tratamento burguês da mulher, que, é um simples adorno "pertencente" ao marido, dedicando-se apenas para as funções domésticas de esposa e mãe, ficando ela sem instrução, presa ao comportamento determinado pelas regras e preconceitos da sociedade em que vive. Isben chocou a sociedade de sua terra, e viveu quase toda sua vida em exílio voluntário.



   Isben também criou "O Inimigo do Povo", aonde denuncia a corrupção política; em "Hedda Gabler", ele analisa os preconceitos de classe em conflito com os instintos naturais.     

Vídeo:









    Suas obras são impecáveis em sua construção dramática, principalmente as realistas. Ele tem uma enorme gratidão por Scribe com a sua Peça Bem-Feita.
  Pela coragem e honestidade com que enfrentou os problemas sociais, Isben se tornou uma figura de imensa importância para época da Revolução Industrial, e o irlandês Bernard Shaw entre outros, foi responsável por uma grande campanha em favor do conhecimento e da aparição do novo teatro.

(Bernard Shaw)

   Bernard Shaw se destacou com a obra "A Profissão da Sra. Warren". O tema gira em torno da prostituição e a sua existência também, nos setores mais conservadores da sociedade.  A relação de mãe e filha, na qual ao estudar em Cambridge, a filha descobre que o dinheiro que a sua mãe lhe envia, provém, de uma rede européia de bordéis que administra. 









segunda-feira, 16 de junho de 2014

Portugal e o Teatro de Almeida Garrett & Jacinto Heliodoro

A Tragédia "Frei Luís de Sousa" de Almeida Garrett e "Álvaro Gonçalves, o Magriço e os Doze de Inglaterra"de Jacinto Heliodoro de Faria Aguiar de Loureiro, são os representantes do Romantismo Histórico Português:


    A história de Almeida Garrett, nascido em 1799, é de um típico português da primeira metade do século XIX, ou mais explicitamente, de Portugal da revolução liberal e romântica. É certo afirmar que, sem a história de Garret, não entenderemos os aspectos essenciais da vida e da cultura portuguesa do seu tempo.
  Lançou-se como escritor de grande público, com uma obra escandalosa "O Retrato de Vênus" - sempre impôs, na vida política, social, e intelectual portuguesa. A sua presença atuante, influente é quase sempre dominante.
   Garret acabou por ser o único homem de Portugal do Romantismo.
  A sua presença não foi altamente significativa apenas em Portugal, chegou aqui no Brasil. A par de entusiásticas referências às notas brasileiras do "Uruguai", de Basílio de Gama, no sentindo de que se livrassem dos vínculos com a literatura clássica, de tradição européia, e realizassem, com a tomada de consciência de sua realidade americana e nacional, uma literatura que fosse livre e original como a nova pátria que começavam a construir.

(Um pouco sobre "Uruguai" de Basílio da Gama)

(Selo em homenagem à Basílio da Gama)

   Garrett não chegou a escrever sobre o Brasil uma obra, houve duas tentativas nesse sentido: uma, na altura dos anos de 1830, a história brasileira "Comuraí"; a outra, é de capítulos do romance inacabado "Helena", passado na Bahia


   Os brasileiros tinha uma grande estima pelo Poeta que iniciara a reforma romântica. A reforma romântica da literatura de língua portuguesa.
  Da ampla e poligráfica obra de Garret, já foram consagradas como pontos mais altos, o poema de "Camões" que sem dúvida é sabiamente a primeira obra romântica da literatura portuguesa. Visto na grandeza de seu espírito, de sua inspiração lírica e épica, de seu patriotismo e de seu pungente drama de exilado que volta à Pátria para sofrer todas as ingratidões dos contemporâneos e para ver a mesma Pátria morrer em "apagada e vil tristeza", depois de sua epopéia dos descobrimentos e conquistas.
   Via-se em "Camões"; e pôde dar a esses sentimentos veemente expressão, porque eram também os sentimentos que o dominavam, bem como a todos os seus contemporâneos, perseguido e deportados, de Portugal e de outros países, da Europa e da América, pela luta contra o absolutismo e despotismo, e pela defesa do liberalismo.


 Outras obras suas, oferecem aos leitores portugueses o seu passado cavalheiresco, místico, marítimo e sentimental, naquilo que a raça portuguesa possuía de mais profundo e permanente em matéria de sentimento religioso, heróico e amoroso.
  "O Romanceiro", despertou em Portugal Romântica, o gosto das velhas tradições nacionais e da poesia popular.
   "Folhas Caídas", uma das expressões "mais eloquentes do lirismo moderno", isto é, do lirismo romântico. Não se escreveram poemas de amor tão intensamente emotivos, lúcidos na análise de uma paixão tão ricos de experiência sentimental, tão delicados no retrato dos encantos e seduções femininas e tão belos quanto foi na poesia romântica portuguesa:

Este inferno de amar - como eu amo! -
Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é a vida - e que a vida destrói -
Como é que se veio a atear,
Quando - ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez... - foi um sonho -
Em que paz tão serena a dormi!
Oh! que doce era aquele sonhar...
Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso
Eu passei... dava o sol tanta luz!
E os meus olhos, que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;
Mas nessa hora a viver comecei...

(Almeida Garrett - Folhas Caídas)

   "Frei Luís de Sousa", foi o drama inspirado na tradição de um complicado e doloroso episódio matrimonial vivido, no fim do século XVI, por Madalena de Vilhena, viúva de D. João de Portugal, desaparecido com D. Sebastião em Alcácer-Quibir. Escrito em dois meses na qual Garrett estava na sua plena maturidade artística, chegando ao completo domínio de todos os recursos de criação dramática. O drama conquistou sem dificuldade o público, a crítica nacional e estrangeira.


   Os estudos críticos de "Frei Luís...", são inumeráveis, mas podemos dirigir em três sentidos. A gênese já aponta as fontes mais diretas e relevantes da "fábula" e as sugestões que influíram na interpretação dramática que lhe deu Garrett. 
   As qualidades, estão na simplicidade do enredo, na concentração dos efeitos dramáticos, na economia e propriedade dos recursos expressivos, na verossimilhança e força dos caracteres e no achado de uma essência trágica, isto é, de uma situação "catastrófica" e, portanto sem solução, essência essa, intuída em profundidade, e tratada com perfeição.


   Quanto à intenção do Autor, não se sabe ao certo. Teria Garret procurado por em evidencia um exemplo de acrisolado e perfeito sentimento patriótico, o que era o caso de D. Manuel de Sousa Coutinho, a resistir, na medida de todas as suas forças, contra a ocupação espanhola de Portugal? Ou, mais profundamente, teria querido Garrett evidenciar a dolorosa situação de uma filha ilegítima para os preconceitos de uma sociedade, em que era o caso da sua filha Maria Adelaide, e também de Maria, filha de D. Manuel e D. Madalena?
   Enfim isso não muda nada, o importante é saber que "Frei Luís..." se tornou uma das grandes obras da literatura universal do drama histórico.

(Almeida Garrett por Guglielmi)

   Jacinto Heliodoro de Faria Aguiar de Loureiro, autor também português, com a sua obra "Álvaro Gonçalves, o Magriço e Os Doze de Inglaterra" é um grande representante também do drama histórico em Portugal.
   Foi o drama escolhido, por concurso público, para a noite de inauguração do Teatro Nacional de D. Maria II, em 13 de Abril de 1846. 


   O enredo narra os regressados da batalha de Aljubarrota e dado o clima de alegria pela vitória dos portugueses, D. João I reconhece Beatriz, amada por Álvaro Gonçalves, um valente cavaleiro, sua filha natural. Este reconhecimento tem como consequência a impossibilidade do casamento de Beatriz e Álvaro, agora que ela se encontra numa posição social que exige que a escolha de marido se conforme com os superiores interesses da nação. 
  Chega, entretanto ao Paço um enviado da Corte de Inglaterra que necessita de 12 cavaleiros que vão vingar a honra de 12 damas inglesas. Logo surge como candidato Álvaro Gonçalves que, acompanhado de outros 11 cavaleiros, parte para Inglaterra.



  E é já nesse país, no Paço de Ricardo II, que se vai desenrolar o quarto ato, assistindo-se a uma luta da qual saem vitoriosos os cavaleiros portugueses.  Ao regressar a Portugal, Álvaro Gonçalves é informado do aprazado casamento de Beatriz com Arundel, conde inglês, revoltando-se assim com a situação. Perante uma possibilidade de raptar Beatriz e ir viver com ela para Castela, Álvaro Gonçalves exibe o seu caráter de nobre português, preferindo levar uma vida de sofrimento a curvar o joelho ante os opressores de Portugal.